Não se podia então dizer que fosse coisa de preocupação. Não era a renda de casa, nem era um filho que dá medo o caminho que está a tomar, não era uma doença da mãe ou da irmã com quem vivia.Quer dizer. Não era só isso. Era isso e onde já se viu aquela vaca da Ana trazer botas de tacão de madeira.
Rápidamente entendera que o médico não tinha muita resposta para lhe dar. Alguns comprimidos que ajudavam um pouco mas que depois era um vira o disco e toca o mesmo…na sua cabeça, todas as noites.
As saudades que eu já tinha da minha alegre casinha…
Vivera naquela casa sempre, não tinha saudades, estava ali. O absurdo desesperava-o.
Jura, que não vais ter uma aventura, daquelas, que acontecem, numa altura…
Ele era na maior parte das vezes, A, aventura. Não casara, não oficializara nunca uma relação. Diriam que era gay? Aliás, diriam que era paneleiro? Porque António usava era campos lexicais mais próximos de sua cozinha, nada de estrangeirismos.
Ora aí tínhamos outra preocupação. A sua reputação, de nadador salvador, bronzeado, másculo. Sempre vivera com a irmã. Que também não casara. Sempre com aquela amiga, a Emília de cá para lá, e depois a Emília fora para Lisboa e casara e a irmã ficara ali, fazendo crochet como se tivesse tecido trinta anos por cada kilometro que as separara. Será que a irmã era gay? Ai, fufa. Será que ela era fufa? Lá se lhe fora o sono.
I kissed a girl and i liked…
Esta sim, vinha ao caso…surpreendia-se com seu inglês. Levantava-se da cama imaginando que então poderia por um b&b, conversar com os viajantes, trocar experiências, uma coisa tipo sarau, tertúlias como as de Coimbra…
Mas depois…aquilo tirava-lhe o sono…onde compraria os móveis, a que horas chegariam os turistas, atirei o pau ao gatototomasogatototo…. e desistia pensando que se tivesse mais calma, até voltaria a dormir.