Transparente, imperfeita, azul e ao final o vermelho polido. Deslizava sobra a superfície perfeita, uma pincelada só feita por algum anjo, só podia ser coisa de anjo, máquina não entendia de perfeição. Via a unha ratada, comida por desigual, os limites redesenhados na ponta do dedo.Tocava a gota e ela escorregava, apanhava outras gotas distraídas e descia enlouquecida até ao chão. Podia quase escuta-la gritando de alegria. Nos desenhos que era ele, isso fora o que lhe disseram na escola, ficava um resto da gota, guardava da tinta vermelha a frescura. Nada lhe dava mais alegria.
O pai aparecia por trás, esperava que ele terminasse, silencioso encontrava as mãos como pás em suas axilas, seguia-se um grunhido que nunca soube se era verdade ou mentira, seria ele tão pesado ou o pai tão frágil?
As orelhas despidas, dos dois, o mesmo recorte, a mesma luta contra o vento. O cabelo que partia suave e regressava crespo. A mãe segurava os seus cachos depois da volta, os dedos enrugados chorando de dor. Não podia gastar tanto em acondicionador. Carrasca do próprio desejo ela vinha, deixava cair o cachinho na terra batida, húmida de suas penas.
Para ele era um preço mais que justo. Um cavalo vermelho, uma lata invencível, rompia o som, desnudava as araras atrevidas, captava os olhares ao chegar à escola. A esse deus avermelhado que lhe oferecera o olhar das meninas, os convites para a bola dos meninos e até o apreço de um ou outro professor acostumado a misérias maiores. Ofereceria sim os seus cachinhos, o couro cabeludo e se fizesse falta até a pele que manchada dizia demasiado sobre quem era.