Se eu subia de elevador o menino subia comigo, se eu descia, o elevador parava no quarto andar.
Perdera a fofura, era demais. Tentei explicar-lhe que às vezes gostava de estar sozinha, sabe, olhar a água da piscina ondando em silêncio, ou pendurar a roupa e sofrer com a queda de uma mola de roupa, sem que isso implicasse um resgate miraculoso. O menino não entendeu bem. Começou a chorar quando eu não guardava o lugar, quando eu ia para a escola com minhas amigas, sem ele.
Os pais telefonaram para os meus pais. Por favor, deixe o Firmin acompanhar a Sofia.
Daí que meus pais acharam que ele tinha uma deficiência qualquer, e eu dizia que não, que ser bobo é de outra gama de cores. Eles não quiseram saber…Leva o menino, Sofia!
Mudámos de escola, pensei que me ia livrar da sombra constante, quieta, magra e ainda assim, pesada. Durou um mês minha liberdade. Firmin começou a escrever post-its em canções, colava no elevador, na caixa postal, no para brisas do fiat de meus pais. Depois vieram as histórias, meio eróticas até, com princesas e sapos que viram príncipes. Coisa de um beijo só. Com língua.
Tinha dezasseis, Firmin doze. Arrumei namorado, Firmin foi internado com uma crise de nervos. Nova ligação para meus pais, que nem estavam a par de meus amorios. O namoradinho e eu nos despedíamos na esquina, protegidos do olho que tudo vê: Firmin, quarto andar!
Tenho vinte, agora, faço faculdade e os post its continuam, no para brisas do velho fiat que se solavanca agora nas minhas mãos. Firmin tem dezasseis. Pediu de prenda de natal que escute um haicai, falei que ok, mas no dia, na noite alias, adormeci. Passara a madrugada estudando. Nada a fazer, tive que aceitar sair com ele, pelo menos vou dançar, pensei. Nada…ele falava, falava, falava. O tímpano doía.
Obcecado com o haicai esse, continua chamando, ligando, escrevendo, whats para cá, post it para lá. Tou achando que é posição do kamasutra. Esse menino é sem noção de mais.
Sabe, tem muita gente doida nessa vida.