Reparei nisso uma manhã destas. Algumas aranhas são peludas. Peludas e morenas. Depois de ver isso, foi difícil deixar de ver. Isso, claro. Não sei o que há nisso de tão capturante, na aranha. Capturante e repulsivo. Voltei a gostar das normais, magras e tímidas que não comem moscas nem mosquitos mas são esperançosas. Como as joaninhas. Eu não sou boa com as plantas, não tenho pulgões, mas espero sempre encontrar uma joaninha. Ah, sim, a esperançosa sou eu, de joaninhas. Porque as joaninhas e as abelhas temem pela sua continuidade, como nós, e como as aranhas depiladas que sobem pelos plátanos das nossas cidades. Aquelas peludas, devem ser mais resistentes. Como as baratas. Como um polvo. Os polvos além dos três corações, são muito inteligentes. Serão muito humanos? Para ser humano, é preciso ter pelo menos um coração, alguma inteligência e algum pêlo. O polvo não tem pêlo, mas pode sempre se apaixonar pela aranha certa. Esta semana vi um polvo desenroscar-se de um frasco e fugir. Foi um pouco como os pêlos das aranhas. Se o polvo foge do frasco, talvez fuja ao fim do amor. Isso seria mesmo pouco humano, mas muito inteligente. Não sei porquê, desde que as aranhas são peludas, e os polvos são filhos de houdini que há coisas mesmos estranhas. Como uma loja que vi esta semana, depois dos pelos e dos frascos, que dizia: ainda aceitamos escudos. Em notas. Escudos de moedas, não. Só notas. Porquê alguém guardaria escudos de sobra? Só se ganharam a lotaria e morreram e foram comidos por gatos e descobertos por uma senhora das imobiliárias a quem caiu o tecto podre em cima. É um filme. La comunidad. Muito bom. Termina com toda a gente a beber chupitos. No entretanto, os estranhos são os vizinhos, e a isso, já estamos todos habituados, tão habituados. Para recuperar o espanto, devíamos ter tentáculos, guinchar tinta preta. Ou ser muito peludos. Fora laser, fora fio egípcio. Ou ter três corações. Um clichê, mas é melhor que pêlo nenhum.